domingo, 31 de janeiro de 2010

O berro





Ei

não consigo levantar
parece que a realidade

acabou



Restos de corpos espalhados
inclusive
na minha cabeça
tortura na mente

imagens

imaginação

lembranças

que não apagam

como gritos de dor

que não acabam



Ei
não consigo respirar
o ar parece chumbo
assim como as balas
que perfuram

Acabou meu fôlego

Estou apagando
há um tanque blindado
vindo na minha direção



Olho e vejo

sinto meu medo

vir junto



arrrhhhhggg



Esteira a esmagar

minha perna

estraçalhar



Grito inútil
no meio do conflito
tento mas não resisto
Apago

acho que estou morto
mas acordo num hospital
Carcaças por todos os lados

seres em desamparo

ambiente superlotado



Sou uma delas

uma das sequelas

Pessoas restos
contas e sobras

Matemática de capitalismo

carnificina do poder

muitos mortos

sofrimentos

verbo haver



Ei
não consigo
deixar agora
a revolta não entrar
bobo eu que aceitava
tudo calado



Eis a única coisa que me ajuda
a conseguir viver
se virar
a revolta contra os governos
criadores de enterros


Ei

Sairei daqui

há um plano

uma tentativa de desobediência

Alguma publicação
sei lá
nem que seja ficar

a berrar

na cadeira de rodas
na porta de qualquer quartel
para pelo menos avisar
que a vida dos jovens

vai se estragar

Entrar ali só pra a vida

aniquilar

a minha e a sua
triste vida dura
ter de abrir
várias sepulturas










MonoTeLha

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